terça-feira, 17 de julho de 2012

17

    Ela só tem 17. Caminha como se a cada segundo se passassem anos. Percorre a vida como se cada dia lhe fosse o último. Toma atitudes impensadas, sem medir suas consequências. Quer viver com intensidade cada segundo. Não liga para o amanhã, apenas segue. Volúvel, confusa, inconstante. Bagunça mentes, destrói corações, e segue. Em cada esquina, uma nova opinião, uma nova atitude. Não tem medo de cometer erros. Cura as feridas, e segue.
    Ela só tem 17, mas se acha a dona do mundo. Apesar de pedir mil conselhos, não segue nenhum. Quebra a cara, mas sempre dá um jeito de consertá-la. Talvez, apenas pelo prazer de quebrá-la novamente. Por tempos teve medo de sair do seu casulo, pois lá era mais confortável. Mas agora que conseguiu a chave para abrir a porta do seu quartinho cor-de-rosa, ela a segura com todas suas forças e não quer mais se cercar pelas quatro paredes.
    Ela só tem 17. Ainda tem muito caminho pela frente, e por isso não tem medo de mudar suas escolhas. Por mais difícil que seja para os outros superar o medo de errar, ela realiza esse feito a todo momento. Não tem medo de viver. Usa suas desilusões como um motor, e com ele vai atrás de novas desilusões. Masoquista? Talvez. Ou quem sabe, ela goste de enfrentar bravamente os sofrimentos porque sabe o quão bom é ser feliz. Faz seus dramas, dá seu show, e depois segue. Age por impulso. E mesmo sabendo o final de suas histórias, ela tenta. Tenta apenas pelo prazer de chegar ao final e dizer que estava certa. Mas pra ela não há nada melhor do que estar errada. Significa que ainda tem muita pra aprender ao longo do caminho.
    Ela só tem 17, e agora é a sua hora de errar. Do seu jeito torto, segue. Por mais que fale aos outros uma torrente de contradições, ela mesma não se confunde, porque independente de sua inconstância, ela sabe o que sente. Podem culpar suas atitudes imprudentes por sua ‘falta de maturidade’, mas quem disse que ela quer ser madura?  Com seu jeito incontido e incontentável quer apenas esconder sua fragilidade. Não mascara seus medos, apenas não dedica tempo a eles. Não pensa, age. Não gosta da perfeição, está em constante mudança, sem objetivos, apenas pela renovação. Busca a felicidade, que assim como ela, é improvável. 

                    
                                                             agarotadapraia.tumblr.com

Texto de Amanda Campelo, gentilmente cedido ao Litros e Letras pela autora. Mais textos de Amanda Campelo em http://campelomodeon.blogspot.com.br/

domingo, 15 de julho de 2012

O barco

Olha, eu sei que o barco tá furado e sei que você também sabe, mas queria te dizer pra não parar de remar, porque te ver remando me dá vontade de não querer parar também.Tá me entendendo? Eu sei que sim. Eu entro nesse barco, é só me pedir. Nem precisa de jeito certo, só dizer e eu vou. Faz tempo que quero ingressar nessa viagem, mas pra isso preciso saber se você vai também. Porque sozinha, não vou. Não tem como remar sozinha, eu ficaria girando em torno de mim mesma. Mas olha, eu só entro nesse barco se você prometer remar também! Eu abandono tudo, história, passado, cicatrizes. Mudo o visual, deixo o cabelo crescer, começo a comer direito, vou todo dia pra academia. Mas você tem que prometer que vai remar também, com vontade! Eu começo a ler sobre política, futebol, ficção científica. Aprendo a pescar, se precisar. Mas você tem que remar também. Eu desisto fácil, você sabe. E talvez essa viagem não dure mais do que alguns minutos, mas eu entro nesse barco, é só me pedir. Perco o medo de dirigir só pra atravessar o mundo pra te ver todo dia. Mas você tem que me prometer que vai remar junto comigo. Mesmo se esse barco estiver furado eu vou, basta me pedir. Mas a gente tem que afundar junto e descobrir que é possível nadar junto. Eu te ensino a nadar, juro! Mas você tem que me prometer que vai tentar, que vai se esforçar, que vai remar enquanto for preciso, enquanto tiver forças! Você tem que me prometer que essa viagem não vai ser a toa, que vale a pena. Que por você vale a pena. Que por nós vale a pena.
Remar.
Re-amar.
Amar.

(Caio Fernando Abreu)

Ausência

Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces 
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto. 
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida 
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz. 
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado 
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados 
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada 
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado. 
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face 
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada 
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite 
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa 
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço 
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado. 
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos 
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir 
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas 
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

Vinícius de Moraes